sábado, 29 de setembro de 2012

Algumas considerações sobre a teoria de Vygotsky e o processo de aprendizagem na velhice

tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social.
Lev S. Vygotsky (1896-1934), professor e pesquisador foi contemporâneo de Piaget.Construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social. Sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.

As concepções de Vygotsky sobre o processo de formação de conceitos remetem às relações entre pensamento e linguagem, à questão cultural no processo de construção de significados pelos indivíduos, ao processo de internalização e ao papel da escola na transmissão de conhecimento, que é de natureza diferente daqueles aprendidos na vida cotidiana. O mesmo apresenta uma visão sobre a formação das funções psíquicas superiores como internalização mediada pela cultura.

Vygotsky necessita ser compreendido a partir de seu contexto histórico. Também contemporâneo de Marx viu no coletivo, respostas que atendiam seus anseios sobre como a linguagem se desenvolve.
Assim, busco nesta base teórica sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento, subsídios para compreender como se dá o processo de aprendizagem na velhice, e de algum modo, assim como o desenvolvimento humano é contínuo, os processos de aprendizagem e a assimilação também são.
Os idosos por serem sujeitos já amadurecidos biologicamente têm algumas peculiaridades na forma como aprendem.

Aprendem não apenas como se comunicar, mas o que e de que modo querem se comunicar. Enfim, de acordo com Vygotsky é a relação com o meio que favorece o aprendizado, inclusive pela questão cultural. A cultura também é o meio no qual o processo de aprendizagem se estabelece.

A cultura fornece ao indivíduo os sistemas simbólicos de representação da realidade, ou seja, o universo de significações que permite construir a interpretação do mundo real. Ela dá o local de negociações no qual seus membros estão em constante processo de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significações.

O processo de internalização é fundamental para o desenvolvimento do funcionamento psicológico humano. A internalização envolve uma atividade externa que deve ser modificada para tornar-se uma atividade interna, é interpessoal e se torna intrapessoal.

O idoso internaliza as formas culturalmente dadas numa dimensão diferente, uma vez que traz consigo o referencial e uma bagagem acumulada ao longo da vida. O funcionamento psicológico daquele que toma conta da própria finitude na medida em que envelhece faz com que tenha condições de escolher com mais sabedoria (ou não) aquilo que deseja aprender e aquilo que não tem interesse em saber.

Isso tem uma dimensão social ampla, e se fundamenta no contexto sócio-histórico de modo que possibilita analisar a si próprio, perceber os próprios erros e corrigir-se. Erros que são percebidos através de um conceito que perpassa o social, a moral, enfim, o conceito que define o certo e o errado é determinado pelo contexto social vigente.

Vygotsky também fala da aprendizagem como elemento fundamental ao desenvolvimento e que ambos os processos são interdependentes. No contexto do idoso é necessário um esforço para enxergar que esse sujeito está se desenvolvendo e não como alguém que já não tem mais o que fazer. No mundo contemporâneo e em decorrência do pensamento capitalista e da globalização econômica e cultural, o idoso vem sendo percebido como excedente. Todavia existe um esforço global para que este conceito errôneo seja desmistificado, uma vez que a produção neste estágio de vida não se perde, apenas se transforma.

É com esse entendimento que, gradualmente, vem se ampliando as atividades de lazer, de cultura, esportivas, educacionais e de saúde para dar suporte as novas demandas dessa faixa crescente da população.

E esse processo de transformação de conceitos deveria motivar o idoso da atualidade a continuar seus processos de aprendizagem, de internalização dos acontecimentos de percepção da própria subjetividade. De acordo com Vygotsky, aprender é um processo complexo que envolve estruturas complexas. O idoso tem maior parte de suas estruturas complexas amadurecidas, contudo só isso não garante os processos de aprendizagem. A condição cognitiva, definida pelo autor como “funções mentais” – pensamento, memória, percepção e atenção – biologicamente podem ser alteradas no processo de envelhecimento humano.

Enfim, a interação social e a linguagem são elementos fundamentais para o desenvolvimento. Nesse sentido Vygotsky define dois níveis de desenvolvimento, o real e o potencial. No primeiro considera-se aquilo que ao sujeito já sabe, o que já conseguiu aprender e no segundo nível, aquilo que o sujeito tem potencial para aprender.

Entres estes dois níveis existe um espaço chamado de Zona de Desenvolvimento Proximal, que é onde o aprendizado de fato acontece através da mediação de outro sujeito. Ou seja, é nessa distância em que se trabalha aquilo que o sujeito sabe e aquilo que ele é capaz de aprender sob orientação e estimulo de um outro sujeito.

Portanto este autor entende que o sujeito não é apenas ativo, mas interativo, que a construção do aprendizado inicia de fora para dentro e esta relação é sempre mediada pela cultura e relacionada ao desenvolvimento mental superior.

Vygotsky vê o sujeito em sua completude o e a partir de conceitos individuais. Diz que o sujeito aprende a significar tudo aquilo que o cerca a partir de sua capacidade de compreensão e da mediação com a cultura. Assim, na minha prática profissional, acredito no idoso como um sujeito em sua totalidade, que não depende apenas de seu potencial genérico para aprender, mas é a todo o momento influenciado na mediação sociedade e sujeito.

Acredito que se vygotsky tivesse vivido mais anos, talvez tivesse buscado compreender a velhice também como uma fase de aprendizado, observando o que fica mais vulnerável no complexo sistema do corpo humano e que de modo direto afetaria nos processos de internalização e nas funções mentais.

Símbolos, linguagem, significados, sentido, são termos comumente encontrados no pensamento deste autor. Aqui é interessante mencionar o que Vygotsky entende por significado e sentido, para compreendermos uma pequena parcela daquilo que o mesmo buscava desvendar no que se refere à linguagem.

Assim, velhice tem como significado uma etapa de vida que acontece mais ao fim do ciclo de vida humano. Contudo para parte dos idosos institucionalizados o sentido da velhice é depreciativo, decadente, triste; enquanto para idosos que residem com familiares a velhice pode também ter o sentido de continuidade, experiência e sabedoria.

Assim, para realizarmos uma aprendizagem eficiente e eficaz é necessário que compreendamos qual o sentido atribuído pelo sujeito a determinado signo. A família é o ambientem mais propicio para a realização de trocas e aprendizagem simbólica e afetiva. Contudo se a família não se faz presente e ativa devemos buscar substitutos equivalentes.

Enfim, quando buscamos subsídios para entender a prática psicopedagógica em espaços fora do âmbito escolar, nos defrontamos com um desafio: a produção de conhecimento e a busca por dados novos sobre outras situações.

Relacionar as idéias de Vygotsky num cotidiano profissional no qual os sujeitos envolvidos têm mais de 60 anos é uma tarefa estimulante e delicada. Mas este processo é importante quando se busca ampliar os horizontes da prática profissional do psicopedagogo.

Entender que na infância o sujeito vai se constituindo e se construindo em todos os aspectos é de fácil aceitação, assim como é tranqüila a compreensão de que a criança é aquela que necessita aprender a viver em sociedade.  Contudo não parece simples a compreensão de que o velho não pára de aprender, mas recicla e renova as formas de assimilação e captação de informações.

Falar em potencial e real, bem como de zona proximal é entender que esta é uma dinâmica contínua na vida dos sujeitos de todas as idades. Toda via o idoso nem sempre necessita de alguém “mais velho”, mas de alguém com um conhecimento diferente daquele que o mesmo construiu ao longo da própria vida. Aprender (com) e ensinar seus iguais é uma constante na vida daqueles que se relacionam com outros idosos.

No contexto social brasileiro atual ouso dizer que o idoso luta diariamente para ressignificar sua existência, contudo, os conceitos cristalizados na história destes sujeitos dificilmente serão modificados, uma vez que já construíram bases sólidas nos processos mentais superiores.

Outra peculiaridade na realidade do idoso são as doenças degenerativas neurológicas. A doença de Alzheimer, por exemplo, atinge no cérebro o campo específico da linguagem e da memória, de modo que o idoso passa a perder gradualmente a capacidade de escrita, fala. Outras demências também afetam o idoso, todavia, nenhuma destas situações os incapacita para a linguagem universal do afeto.

Enfim, Vygotsky traz uma belíssima contribuição à sociedade, na medida em que busca conhecer e explicar os caminhos que a mente humana faz para aprender e se desenvolver. Esta é uma pequena reflexão ante o imenso universo de conceitos, idéias e contribuições deixadas por Vygotsky.

Obras consultadas
BESSA, V. H. Teorias de Aprendizagem. Curitiba: IESDE, 2006.
TAILLE, Y.; OLIVEIRA, M. K.; DANTAS, H. Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias Psicogenéticas em discussão. 18. ed. São Paulo: Summus, 1992.
ZACHARIAS, V.L. Vygostsky e a educação.

publicado em 24/08/2010 - por Michelle Clos na categoria 'Artigos'

2 comentários:

  1. No Brasil, segundo o IBGE, o número de idosos cresce progressivamente, enquanto decresce a população de jovens e crianças. Em decorrência disso, nossa sociedade precisa se
    adequar às necessidades de sua população idosa, isto é, garantir os direitos destes
    cidadãos, dentre eles, a educação.
    Em um sistema onde a juventude é hipervalorizada,é preciso nos conscientizar que atitudes preconceituosas servem como barreiras ao crescimento intelectual dos idosos.Quando um idoso vai a escola a grande maioria desdenha: “O que ele está fazendo aqui? Seu tempo já passou.”
    Derrubar o conceito errado sobre o idoso (caduco, teimoso, chato), que foi formado ao longo dos anos , não será tão fácil. Mas mudaremos esta realidade através da educação, difundida principalmente nas escolas contando também com o apoio da mídia.

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  2. Não importa a idade,temos sempre que estar aprendendo algo que faça nós como pessoas evoluirmos.Um idoso também é capaz de aprender coisas novas e por em prática aquilo que aprendeu.
    Estimular o cérebro na velhice mantém ele ativo e saudável e também mantém uma capacidade extraordinária de desenvolvimento e recuperação. O que mostra que qualquer um pode ter uma memória tão boa quanto a de um jovem

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